UM PAÍS QUE NÃO EXISTE MAIS

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

O que os militares fizeram foi uma contrarrevolução para frear uma revolução socialista

Artigo de Claudio de Cicco é professor de Teoria Geral do Direito e Teoria Geral do Estado na PUC-SP

Para se poder definir qual a natureza política e social do que ocorreu no Brasil, em março de 1964, é preciso, antes de tudo, deixar claro o que se entende por “revolução”e por “golpe de Estado.
Revolução, é uma violenta quebra da hierarquia social e política, em uma nação, pondo abaixo o que estava no topo e em seu lugar colocando os que estavam embaixo na hierarquia social e política.
Costuma-se, por exemplo, chamar de “revolução” o que aconteceu na França de 1789 em diante, pois o que estava na hierarquia superior da sociedade, a nobreza, foi derrubada por uma classe que lhe era inferior no antigo regime, a burguesia. Esta subiu para a posição de classe dominante, enquanto que os antigos aristocratas se tornaram cidadãos comuns aos outros, sem privilégios, sem poder político, e foram colocados como foras da lei, aprisionados, julgados, condenados e guilhotinados.
Já um golpe de Estado é a ruptura da ordem jurídica para substituição de elementos no governo, ou liquidação de um órgão no governo de um Estado. Neste sentido, Napoleão Bonaparte deu um golpe em 10 de novembro de 1799, 18 Brumário do calendário novo, quando bruscamente instalou um governo autoritário.
Mas em 64 no Brasil, creio que é pouco falar só em golpe, pois além do presidente legal João Goulart ser deposto, a ordem jurídica foi não só quebrada mas substituída por um regime de exceção, com os Atos Institucionais 1, 2, 3 e 4, e sobretudo o de nº 5. A nova ordem depois emitiu nova Constituição, a de 1967, Novo Código de Processo, em 1972, introduziu a Legislação do Imposto de Renda com maior alcance e rigor, além de criar instrumentos de repressão da liberdade de pensamento, como o famoso Serviço Nacional de Informações.
É claro que isto tudo levou o regime de 64, até 1984, a ser pouco parecido com o regime liberal em que vivia o Brasil, sob a égide da Constituição que foi violada, a de 1946.
O que aconteceu em 64 não foi uma revolução pois os militares deram nítida conotação anticomunista a seu movimento. Com tal bandeira eliminaram os possíveis pretendentes ao poder, fossem líderes sindicais ou guerrilheiros. Com isto manteve-se no poder ilesa toda uma elite capitalista. Neste sentido, a verdadeira revolução era a movimentação das forças comunistas, mais ou menos inspiradas pelo modelo da revolução cubana.
Em nossa modesta opinião, o que os militares fizeram foi mais precisamente uma contrarrevolução, ou seja, um movimento armado que quebra a ordem jurídica para frear uma revolução socialista e impor não um regime liberal mas um regime autocrático de rígido controle estatal,servido por uma tecnocracia irresponsável perante a nação, mas obediente ao poder absoluto dos donos do poder.

Extraído do site  http://www.jornaldocampus.usp.br/index.php/2011/10/1964-um-golpe-ou-uma-revolucao/#1

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