UM PAÍS QUE NÃO EXISTE MAIS

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Uma reflexão de Maia Kowsky

Na primeira noite,
eles se aproximam
e retiram uma flor
do nosso jardim,
e não dizemos nada.

Na segunda noite,
já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.

Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a lua e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E, justamente porque não dissemos nada,
agora já não podemos dizer mais nada.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Articulista do ‘Financial Times’ quer espantar alma de Marx de Wall Street




Extraído do site http://grabois.org.br/portal/noticia.php?id_sessao=8&id_noticia=6611

“Em meio a quase todas crises periódicas que afetam as economias mercantis, erguem-se vozes dizendo que 'No fim das contas, Marx estava certo'", diz ele. Brittan recorda que alguns anos atrás Nicolas Sarkozy, o poresidente da França, foi visto empunhando uma cópia de Das Capital. Nas últimas semanas, complementa, gurus financeiros, entre eles Nouriel Roubini e George Magnus, escreveram artigos com referências ao “pensador comunista”.

Segundo Brittan , quando a recuperação acontece a grita se dissipa, apenas para ressurgir na vez seguinte em que ocorre uma contração brusca. “A primeira coisa errada no slogan é que ele tem pouco a ver com Karl Marx”, diz ele. “Lembro-me de uma senhora, sob outros aspectos uma profissional extremamente inteligente que, quando indagada sobre por que era marxista, respondeu: ‘Eu fiquei entediada com os amigos de meu pai’.” Em seguida o articulista do Financial Times divaga por caminhos obscuros da história, deixando de lado as luzes do marxismo para mirar em personagens que o imperialismo elegeu como alvos principais — principalmente os revolucionários marxistas Josef Stálin e Mao Tse tung.

Divisão da história

Brittan tenta separar Marx dos marxistas. “É, evidentemente, absurdo culpar Marx, que viveu de 1818 a 1883, pelos crimes cometidos décadas após sua morte. Na verdade, o grande homem disse certa vez: ‘Seja lá que outra coisa eu possa ser, não sou um marxista’. Muitos analistas sérios têm escrito sobre o que Marx quis dizer ou deve ter desejado dizer. Não sou um deles e minha desculpa principal para dar minha própria opinião extremamente seletiva é que nunca demonizei nem adorei esse homem”, escreve. Essa resvalada retórica na verdade serve de gancho para ele enveredar pelo mais baixo antimarxismo ao discorrer sobre a essência da obra de Marx — possivelmente para tentar espantá-la de Wall Street e adjacências.

Começa dizendo que o aspecto de Marx que originalmente o intrigou foi sua divisão da história após o fim da Idade das Trevas: feudalismo, capitalismo, socialismo e comunismo. “Por socialismo, Marx entendia algo semelhante a uma versão extrema da antiga quarta cláusula do Partido Trabalhista britânico, que contemplava a propriedade pública de todos os meios de produção, de distribuição e de trocas. Mas comunismo não implicava nada semelhante a seu significado posterior. Era uma utopia na qual um dia de trabalho curto proveria todas as necessidades da sociedade e as pessoas ficariam livres para ‘caçar de manhã, pescar à tarde e discutir filosofia à noite’. A visão de uma sociedade assim reteve no campo marxista alguns idealistas que, do contrário, poderiam ter abandonado a causa”, assevera.

Livro de Rudolf Hilferding

Partindo daí ele discorre sobre outros aspectos de menor importância. Para ele, “há muitos problemas na versão marxista”. “Será que o capitalismo começou nas repúblicas da Itália no século XV ou ainda não tivera início em muitas regiões da Europa onde a Revolução Industrial não se firmou efetivamente até um momento bem avançado do século XIX? E o que dizer sobre a Rússia, que ainda não tivera uma revolução capitalista, mas onde Marx tinha um número surpreendente de discípulos? Isso começou a preocupá-lo no fim de sua vida, quando ponderou se a Rússia poderia passar diretamente ao socialismo”, escreve.

Brittan cita a conhecida introdução de A. J. P. Taylor, historiador conservador inglês, em uma edição do Manifesto do Partido Comunista (editora Penguin) na qual ele determina que o marxismo foi uma peculiaridade do mundo de língua alemã. “Sua elaboração mais interessante veio de Rudolf Hilferding, um social-democrata austríaco cuja contribuição duradoura foi formulada em seu livro Das Finanzkapital. Nele, Hilferding chamou a atenção para uma nova faceta sinistra, a ascensão de banqueiros e financistas por trás da crescente cartelização do sistema produtivo. Ele não previu a importância bem maior da massa de dinheiro artificial cruzando fronteiras, o que certamente é extremamente relevante, num momento em que os banqueiros centrais estão quebrando a cabeça sobre como reanimar a economia mundial”, finaliza.

Interpretações da realidade

Essas passagens revelam o velho problema da indiferença em relação à alma do marxismo — a dialética. Um exame, mesmo sumário, da obra de Marx evidencia que Britan repete a batida na mesma tecla já milhões de vezes tocada pelos que evitam compreender o marxismo com espírito científico, isento de paixões e sem a carga irracional de ódio herdada em boa parte de preconceitos incutidos por anos de anticomunismo. Mesmo quando ele não é excluído da categoria de fenômeno social — o marxismo é ensinado até nas universidades norte-americanas —, procuram a todo custo destituí-lo de sua alma. É assim que os espíritos se fecham ao seu conhecimento, possivelmente com medo de a ele se converter.

Foi precisamente esse grande pensador quem decifrou o código da economia de crise. E isso não está em nenhum livro em particular. Está no conjunto de sua obra, da qual a parte mais importante é, certamente, O Capital. Ignorar essa premissa básica do marxismo equivale a sair à cata de mitos na tentativa de fugir da realidade. E quem lembra isso, evidentemente em tom crítico, é ninguém menos do que Paul Krugman, o prestigiado economista do MIT (Massachusetss Institute of Tecnhology), assumidamente keynesiano, que, ao comentar as comemorações dos 150 anos do Manifesto do Partido Comunista, em 1998, escreveu: "Artigos proclamam que a turbulenta economia mundial de hoje é exatamente o que o grande homem previu. Um colunista do New Yorker chegou a proclamar Marx como o pensador do futuro."

Interpretações da realidade

Karl Marx não é, portanto, apenas mais um nome no balaio de gatos dos gurus da economia. Ele é, antes de qualquer outra coisa, um cientista que se destaca na história do pensamento social. Sua teoria difere substancialmente das idéias voláteis que são propagadas por gente que ganha a vida montando frases de efeito e expelindo perdigotos em palestras sobre o mercado e redução do Estado mundo afora.

A interpretação científica dos seus princípios radiografa casos de sucesso e fracasso em uma sociedade, gera novas interpretações da realidade, cria novos paradigmas e equações para entender e explicar o que ocorre no mundo. Ao contrário da maioria das pessoas que escrevem ou escreveram sobre economia, Marx tinha farinha no saco — e, por isso, é uma das raras fontes seguras nesse terreno. Por tudo, Marx precisa ser estudado. Por sua originalidade, pela seriedade e consistência de sua obra, porque escrevia bem. Talvez seja por isso que Wall Street tenha tanto interesse em sua leitura. O medo é o de que as grandes massas compreendam a sua alma e tomem seus destinos nas mãos — seguindo a máxima marxista de que não basta interpretar o mundo, mas, sim, tranformá-lo. Daí o esforço milhões de vezes repetido para tentar vulgarizar o marxismo.

Antimarxismo primitivo

Samuel Brittan adota o modelo mais ordinário de vulgarização da obra de Marx: a tentativa de associá-la ao autoritarismo. Não há dúvida de que as experiências socialistas carregam nas costas distorções grosseiras no que diz respeito à interpretação do marxismo. Não resta dúvida também que os dois personagens citados pelo articulista do Financial Times, Josef Stálin e Mao Tse Tung, são os principais responsáveis por essas distorções. Repassar os motivos que os levaram a cometer erros, no entanto, seria chover no molhado. O que importa é constatar que seus acertos pesam muito mais em qualquer balança honesta que se utilize para analisar os processos históricos.

Ao lado deste antimarxismo primitivo, outras vulgaridades mais sofisticadas tentam demonstrar o marxismo como algo essencialmente equivocado. Uma delas é a apresentação da obra de Marx impregnada de erudição e afogada em terminologia complicada, uma forma de obscurecer os problemas. Falta clareza para chegar às situações concretas. E há também os grupos “esquerdistas”, para os quais o anticomunismo de “esquerda” tornou-se uma fixação fanática, um preconceito inextirpável. Nada melhor do que a definição de Lênin para estes grupos: o extremismo é filho de erros oportunistas.

Marx sem alma

Não é possível falar do legado de Marx sem o seu parâmetro revolucionário, sem a sua alma, a sua essência. Numa palavra: a dialética. O marxismo, independente do que dizem dele os já decrépitos “novos filósofos”, não pode evidentemente ser resumido a um modelo. Os bolcheviques de “têmpera especial” partiram a história em duas, abalaram o mundo, romperam pela primeira vez a estrutura e a lógica do capitalismo e do imperialismo — tomaram o céu de assalto, como dizia Karl Marx sobre os revolucionários da Comuna de Paris de 1871 —, mas foram marxistas do seu tempo. O desenvolvimento histórico obriga os marxistas a uma nova perspectiva revolucionária. E, com isso, a um novo posicionamento.

Marx e Engels, no Manifesto do Partido Comunista, estavam bem longe de qualquer triunfalismo revolucionário. Eles disseram que a luta entre classes antagônicas de uma sociedade dilacerada — como é a sociedade capitalista — pode perfeitamente terminar “com a ruína das classes em luta”. Não há nenhuma “providência histórica” que garanta a vitória da classe revolucionária — aquela que poderia superar a contradição existente e recompor a sociedade. Não basta, portanto, como lembrou Galileu Galilei quando acossado pelos aristotélicos das universidades, filosofar folheando textos nos quais fatalmente são encontradas todas as soluções para todos os problemas. Por tudo isso, pode-se concluir: os antimarxistas, como o articulista do Financial Times, leêm um Marx sem alma.


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Editor do Grabois.org.br

sábado, 20 de agosto de 2011

Três cortes para Glauber

ATA DO ENSAIO DE 18/08/2011

Presentes ao ensaio: Alexandre, Cesar, Cristiane, Paula e Ricardo.

Terra em Transe - Glauber Rocha

Glauber Rocha: revolucionar a arte e a vida

Extraído do site http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=161837&id_secao=11

O legado do genial criador de Terra em Transe e Deus e o Diabo na Terra do Sol foi o rompimento com a estética americanizada e o olhar agudo sobre as contradições nacionais

Por José Carlos Ruy




Faz 30 anos que o Brasil e o cinema perderam o baiano Glauber Rocha (Vitória da Conquista, 14 de março de 1939 – Rio de Janeiro, 22 de agosto de 1981), expoente e teórico do Cinema Novo, autor de filmes antolólgicos que revolucionaram a arte cinematográfica e marcaram a cultura brasileira desde a década de 1960.

Glauber começou a filmar no final da década de 1950, tendo realizado o filme Pátio (1959) ainda no tempo de estudante. No clima político e intelectual efervescente do início dos anos 60, produziu os titulos que fizeram sua fama e legado, como Barravento (1962) e Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963), seguidos pelos clássicos Terra em Transe (1967), que foi o manifesto de uma geração, diz a crítica Ivana Bentes, e O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro(1968).

Glauber foi o porta-bandeiras de uma arte engajada e de uma estetética que, rompendo com a linguagem cinematográfica que copiava os modelos norte-americanos, fosse capaz de exprimir as contradições, complexidades e visões de mundo dos países pobres.

Depois de 1964, foi colocado, claro, na lista dos inimigos da ditadura militar (embora, no final dos anos 70, tenha reavaliado favoravelmente sua opinião sobre os militares). Com o endurecimento da ditadura a partir de 1968, as condições de trabalho ficaram cada vez piores.

Glauber, que havia sido preso em 1965, ficou novamente na mira da repressão. A prisão no final de 1970 da equipe de O Pasquim, do qual era colaborador, foi o estopim e, em 1971, partiu para um exílio quase permanente pelo resto de sua vida.

No exterior, seus filmes faziam um sucesso crescente. Barravendo foi premiado, em 1963, no Festival Internacional de Cinema da Tchecoslováquia; em 1964, Deus e o diabo na terra do sol recebeu o Grande Prêmio no Festival de Cinema Livre da Itália e o Prêmio da Crítica no Festival Internacional de Cinema de Acapulco.

Terra em Transe trouxe um reconhecimento internacional mais amplo, com várias conquistas: o Prêmio da Crítica do Festival de Cannes, o Prêmio Luis Buñuel, na Espanha, Prêmio de Melhor Filme do Festival Internacional do Cinema de Locarno (Itália), e o Golfinho de Ouro como melhor filme do ano no Rio de Janeiro. O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro também conquistou o prêmio de melhor direção no Festival de Cannes e também o Prêmio Luiz Buñuel.

Artista de vida intensa, dizia não temer a morte. Em Sintra, Portugal, onde morou nos últimos anos, chegou a dizer ao ator Patrick Bauchau, que lá estava com Wim Wenders para filmar O Estado das Coisas, que "para a média de idade de um latino-americano, aos 42 anos já vivi bastante".

O principal, para ele, era mudar o mundo, não só no plano da estética mas, também no plano da vida, da política, da sociedade. E, baiano do sertão mas criado em Salvador, conhecia a índole brasileira como poucos. "Nossa cultura é a Macumba e não a ópera. Somos um país sentimental, uma nação sem gravata", disse certa vez (esta frase, e as seguintes, foram coletadas por Ivana Bentes e publicadas no texto “Glauber Rocha”, em http://www.vidaslusofonas.pt/glauber_rocha.htm).

A mistura, em sua memória, das leituras da Bíblia na infância, das histórias sertanejas de matadores de cangaceiros e outras lendas do interior, foram férteis e, desde muito jovem, dizia que seria um escritor para escrever "sobre minha terra. Prefiro os escritores brasileiros aos europeus.” E, aliás, tinha uma identificação forte com os românticos brasileiros.

Certa vez pediu ao poeta e jornalista baiano João Carlos Teixeira Leite (o “Joca”, dono do Jornal da Bahia,, que foi colega de escola de Glauber no Colégio Central e se tornou seu amigo íntimo): "Quando eu morrer escreva no Jornal da Bahia que, como Álvares Azevedo, foi poeta/sonhou/amou na vida".

Menino ainda, aprendeu a amar a poesia de Castro Alves, que via como um “amante das antíteses e das hipérboles”, como ele, próprio. “Sofro da mesma exaltação poética! Ao longo da minha vida, a admiração pelo poeta abolicionista só foi superada pela identificação com o cineasta russo Sergei Eisentein, fui até Moscou em 1976, para ver seus arquivos, e tenho verdadeira reverência por Bertold Brecht. Mas "a poesia e a política são demais para um só homem!"

Fiel ao lema que inventou – uma ideia na cabeça e uma câmara na mão - Apoiou a revolução cubana, filmou a Revolução dos Cravos em Portugal, em 1975, rodou o mundo para filmar as esperanças e as perplexidades dos povos, aproximou-se, em Paris, da Aliança de Libertação Nacional (ALN),encontrou-se com Luís Carlos Prestes em Moscou, em 1976. Deixou a vida jovem, com 42 anos de idade, deixando um legado de engajamento estético e político intenso, poucas vezes superado.

domingo, 14 de agosto de 2011

ATA DO ENSAIO DE 11/08/2011







Presentes: Alende, Alexandre, Cristiane, Paula, Ricardo, Sillas. Luisa tem feito ensaio à parte dada a sua impossilibidade de estar presente ao ensaio normal.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

PRÓXIMOS ENSAIOS - TERÇA E QUINTA-FEIRAS - 16 e 18/08 - ÀS 13:30 HORAS NO TEATRO

OS ARQUIVOS DA DITADURA QUE OS MILITARES BRASILEIROS QUEREM OCULTAR

 

Documentos da ditadura militar brasileira, obtidos pelo jornal Página/12, trazem detalhes inéditos dos arquivos que a presidenta Dilma Rousseff quer tornar públicos. Militares resistem à divulgação desses arquivos. Matéria publicada neste domingo no jornal argentino traz informações sobre atuação de Azeredo da Silveira, chanceler do general Geisel, que antes de assumir o Itamaraty comandou a embaixada na Argentina, onde teria sido um "pioneiro do terrorismo de Estado regionalizado". Da leitura de centenas de papéis em poder do Página/12 fica claro que os contatos eram frequentes, e grande a afinidade dos militares brasileiros com os golpistas de 1976 na Argentina. A reportagem é de Dario Pignotti.

“O ex-presidente argentino Juan Perón esteve na mira dos serviços de Inteligência brasileiros. Isso é quase um fato. Participei de reuniões com ele, se pressentia que nos vigiavam. Se abrirem os arquivos da ditadura, como quer a presidenta Dilma, surgirão mais provas disso”.

A afirmação é de João Vicente Goulart, filho do ex-presidente João Melchior Goulart, Jango, amigo do general argentino por mais de duas décadas. Transcorridos 47 anos da derrubada Jango e 38 de seus últimos encontros com Perón, provavelmente espionados por agentes brasileiros, “é hora de terminar com esse longo silêncio, ainda vivemos de costas para a história dos anos 70 devido às pressões de grupos ligados ao terrorismo de Estado”, lamenta João Vicente.

Dilma Rousseff parece compartilhar essa preocupação e, na semana passada, instruiu seus ministros, em particular a titular de Direitos Humanos, Maria do Rosário, para que convençam o Congresso a aprovar imediatamente o projeto sobre a Comissão da Verdade, contra o qual se insubordinaram os chefes das forças armadas em dezembro de 2009.

“Certo dia estava em um hotel de Madri, com papai, atendi o telefone e alguém me disse: “Quero falar com Janguito, diga que sou o general Juan Perón. Eu não podia acreditar, mas era verdade. Perón estava do outro lado da linha para convidar Jango para uma conversa na residência da Porta de Ferro. Creio que era o início de 1973”, relatou Goulart ao Página/12.

“Em uma ocasião, falou-se da possibilidade de haver um acordo. Meu pai (fazendeiro) venderia carnes no marco de um plano trienal que iria ser implementado pelo governo peronista, mas que fracassou por influências do bruxo”, apelido pelo qual era conhecido José López Rega. “Ocorreram mais reuniões com Perón, outra foi em Buenos Aires. Lembro que algumas pessoas nos diziam que os serviços de Inteligência estavam rondando por ali”.

Algo parecido ocorria com o ditador Ernesto Geisel, que se referia ao argentino como a “Múmia” e o excluiu de sua cerimônia de posse, no início de 1974, da qual participaram o chileno Augusto Pinochet, o boliviano Hugo Banzer e o uruguaio Juan María Bordaberry. Geisel iniciou um período de mudanças na política externa, conhecido como “pragmatismo responsável”, caracterizado pela abertura de relações com países do Terceiro Mundo e menor alinhamento com os Estados Unidos. Este giro não implicava o fim da estratégia de contenção do comunismo. Outra marca de sua política externa foi a intensa, e por vezes contraditória, relação com o secretário de Estado, Henry Kissinger. Nenhum chanceler teve mais sintonia com Kissinger do que Francisco Azeredo da Silveira, que esteve no cargo durante o quinquênio de Geisel.

Antes disso, Azeredo comandou a embaixada na Argentina, “onde foi um pioneiro do terrorismo de Estado regionalizado; em 1970 foi o responsável pelo sequestro em Buenos Aires e transporte ilegal ao Brasil do coronel Jefferson Cardin, um militar nacionalista e brizolista que foi meu companheiro na prisão do Rio de Janeiro”, diz Jarbas Silva Marques, prisioneiro político entre 1967 e 1977. “Jefferson Cardin me disse na prisão do Rio que Azeredo da Silveira, sendo chanceler, sabia tudo sobre a Argentina e certamente sabia dessa possível espionagem sobre Perón e mandava a embaixada colaborar com os golpistas”.

“Essa é uma história pesada, estamos falando do chefe da diplomacia brasileira entre 1974 e 1979. De uma política de Estado. Até hoje há gente querendo esconder essa história debaixo do tapete, há muita pressão. Vemos o presidente do Senado, José Sarney, fazendo lobby a favor dos militares para impedir que Dilma abra os arquivos, disse Silva Marques ao Página/12.

É impossível fazer uma reconstrução acabada de todos os movimentos da diplomacia brasileira e seus pactos com os golpistas argentinos, devido à falta de documentação suficiente. Da leitura de centenas de papéis em poder do Página/12 fica claro que os contatos eram frequentes, e grande a afinidade com aqueles que perpetrariam o golpe de 1976. A guerra suja já lançada então contra a “subversão” era aprovada.

O telegrama “secreto” enviado pela embaixada brasileira no dia 3 de setembro de 1975 dá conta de uma “longa conversa” com os “comandantes Jorge Videla e Eduardo Massera”, que expressaram seu interesse em “estimular por todos os meios a aproximação das Forças Armadas” de ambos os países. Em outra mensagem “confidencial”, de 19 de fevereiro de 1975, fala-se sem eufemismos da coordenação repressiva. A nota relata um encontro oficial de diplomatas brasileiros com o ministro da Defesa argentino, Adolfo Savino, quando se tratou com “total franqueza da necessidade de um profundo entendimento de nossos países frente aos inimigos comuns da subversão”.

Durante sua conversa com o Página/12, o filho de João Goulart e Jarbas Silva Marques lamentaram o “atraso” histórico do Brasil frente a Argentina, o Chile e o Uruguai, onde “houve um ajuste de contas com a história e a verdade”, mas manifestaram esperança de que essa situação possa ser revertida. Eles, assim como vários organismos de direitos humanos, confiam no compromisso com a verdade assumido por Dilma Rousseff, vítima de prisão e torturas durante o regime militar, assim como na pressão internacional. Citam o exemplo da decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos que condenou o Estado brasileiro por não julgar os crimes da ditadura.

Tradução: Katarina Peixoto

   
Fotos: O ex-chanceler Azeredo da Silveira com o ex-secretário de Estado dos EUA, Henry Kissinger

sábado, 6 de agosto de 2011

O GOLPE DE 1964 E A OPERAÇÃO CONDOR


jangoBrizola

Por Túlio Velho Barreto
No dia 1o de abril, o Golpe Civil-Militar de 1964, que destituiu e exilou o governador Miguel Arraes e o presidente João ‘Jango’ Goulart, completa hoje exatos 44 anos. Mas, infelizmente, muitas histórias relacionadas ao regime militar (1964-85), sobretudo aos ‘anos de chumbo’, ainda são desconhecidas, apesar dos esforços de muitos para que o governo Lula abra os arquivos oficiais sobre o período. E das inúmeras promessas dos presidentes desde o retorno à democracia: Collor, Itamar, FHC e Lula, em especial dos dois últimos, que tiveram condições mais favoráveis e, por suas trajetórias pessoais, legitimidade para tanto.
Assim, um dos episódios mais terríveis do período continua encoberto sob espessas e inertes nuvens. Refiro-me à Operação Condor, a aliança firmada entre militares do Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile e Bolívia destinada a monitorar, perseguir e, eventualmente, eliminar as principais lideranças oposicionistas às ditaduras na América do Sul. Tudo sob a benção dos EUA e o pretexto do combate ao terrorismo na região. Tratava-se de cooperação entre as forças de repressão daqueles países para eliminar as lideranças que, em um eventual retorno à democracia, pudessem reassumir seus mandatos e comandar rigorosa apuração sobre crimes cometidos pelos militares.
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A Operação Condor funcionou ativamente na segunda metade da década de 1970, época em que Miguel Arraes, exilado na Argélia, foi informado pelo governo local sobre a ação. Apesar da relevância dos acontecimentos que se sucederam, só nos últimos anos de vida, o ex-governador falou sobre o tema. Em suas duas últimas longas entrevistas, ambas sobre as origens e conseqüências do Golpe de 1964, concedidas para dois projetos da Fundação Joaquim Nabuco em parceria com o Jornal do Commercio, Arraes deu detalhes de como tudo ocorreu. As entrevistas fazem parte do livro A Nova República – Visões da Redemocratização (CEPE, 2006), escrito em colaboração com os jornalistas Sérgio Montenegro Filho e Paulo Sérgio Scarpa.

Na ocasião, Arraes rememorou encontros com interlocutores do coronel argelino Sulleiman Hoffman, assessor para assuntos internacionais do presidente Houari Boumedienne, ocorridos no início de 1976. É Arraes mesmo quem conta o que ouvi deles: “Havia uma decisão da linha dura de assassinar todos aqueles que tinham certa influência em seus países. Porque eles estariam prevendo um recuo do processo de militarização. Mas, para recuar, precisariam aniquilar esses homens, que tinham influência, para poder ter controle sobre o processo mais aberto”. E foi orientado para avisar aos exilados brasileiros. Pouco tempo depois, lembrou, foram assassinados o senador Zelmar Michelini e o deputado Héctor Gutiérrez Ruiz, ambos uruguaios (maio); o presidente deposto da Bolívia, o general Juan José Torres (junho); e o ex-embaixador do Chile nos EUA, Orlando Letelier (setembro).
Através de emissários, Arraes informou a Leonel Brizola, que cambiou o Uruguai, onde estava exilado desde 1964, pelos EUA, e encontrou-se pessoalmente com o ex-presidente Jango, em Zurique, na Suíça. Jango, que permaneceu no Uruguai, morreria em dezembro de 1976, apenas quatro meses depois da morte do ex-presidente JK. Já Carlos Lacerda morreria em maio de 1977, ano em que quase todo o Comitê Central do PCB foi dizimado. “Eu não posso dizer que Juscelino não morreu num acidente, que a morte de Goulart não foi natural, ou mesmo a de Carlos Lacerda. O que eu posso dizer é que eles estavam condenados à morte. A condenação estava feita e foi comunicada. Então, eu não posso entender como três homens importantes no Brasil, cada um à sua maneira, morreram numa sucessão de meses…”, concluiu Arraes. É relevante destacar que, em 1966, JK (PSD) e Jango (PTB), as maiores lideranças de seus extintos partidos, tinham sido procurados pelo inimigo comum Carlos Lacerda, maior liderança da UDN, para constituir a Frente Ampla – de vida curta – contra o regime militar.
Hoje, apenas a insistência do governo Lula em não abrir os arquivos da ditadura – ou, pelo menos, o que dele restou – faz a tese de Arraes parecer conspiratória. Aliás, o ex-ministro de três dos cinco governos militares, o coronel reformado Jarbas Passarinho, confirmou, em entrevista à Folha de S.Paulo, em janeiro deste ano, a existência da Operação Condor. E, como mostrou Elio Gaspari, em A Ditadura Derrotada (pág. 324), em 1974, o general-presidente Ernesto Geisel já considerava legítimo matar opositores. Agora, juízes italianos e espanhóis mostram-se dispostos a investigar brasileiros envolvidos na operação. E o espião uruguaio responsável por vigiar Jango foi localizado e preso. Tais fatos deveriam ser suficientes para que o governo Lula saldasse uma enorme dívida do Estado brasileiro com a cidadania: o direito à verdade.

* Tulio Velho Barreto é cientista político e pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco, Túlio Velho Barreto é um dos organizadores de Na Trilha do Golpe – 1964 Revistado (Massangana, 2004) e um dos autores de A Nova República – Visões da Redemocratização (CEPE, 2006), dentre outros.

extraído do blog http://acertodecontas.blog.br/artigos/o-golpe-de-1964-e-a-operao-condor/

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

ATA DO ENSAIO DE 02/08/2011

Estiveram presentes neste último ensaio: Alexandre e Ricardo. Por motivos justificados não compareceram Cristiane, Cesar e Luisa. Para nossa alegria, a Professora Renata Feital participou da reunião nos orientando em todo decorrer do ensaio.Nossos agradecimentos à Mestra.

Assembleia Popular de Cuba: semanas decisivas para Gerardo

Para muitos, o verão é um período de férias. No entanto, deveremos intensificar nesse período o trabalho sistemático para colocar em prática as novas diretrizes estabelecidas do 6º Congresso do Partido Comunista e as decisões da Assembleia do Governo para atualizar e aperfeiçoar o socialismo cubano.

manifestação cinco cubanosManifestantes pedem a Obama que solte os cinco cubanos presos nos EUA

Da mesma maneira, devemos elevar a um plano superior a luta pela liberação dos cinco socialistas cubanos Gerardo Hernández Nordelo, Ramón Labañino, Antonio Guerrero, Fernando e René González.

É o momento de multiplicar sem descanso as ações para demolir o muro de silêncio que permite Washington perpetuar a injustiça. Os chamados “jornalistas” de Miami – que caluniaram nossos companheiros, provocaram e ameaçaram os membros do tribunal apesar dos protestos da própria juíza – devem entregar as informações que escondem.

Deve-se exigir que mostrem as imagens de satélites que ocultam há 15 anos – certamente porque guardavam a mentira norte-americana sobre a localização do incidente de 24 de fevereiro de 1996. Devemos reclamar, mais uma vez, aos chamados meios de comunicação que eliminaram a censura que havia imposto ao documento em que Washington admitiu, há dez anos, a impossibilidade de sustentar sua principal acusação contra Gerardo.

As próximas semanas serão decisivas para a conclusão do processo de habeas corpus de Gerardo e como tem ocorrido em ocasiões anteriores, ele enfrenta novos e graves obstáculos que se somam a sua já muito difícil situação carcerária e constituem uma clara violação aos seus direitos e às próprias normas norte-americanas.

Nesta etapa crucial, foram criadas dificuldades adicionais para a comunicação com os advogados e com os funcionários consulares cubanos. O acesso a correspondência é restrito e impedido. Diante dessa situação, proponho que adotemos o seguinte acordo:

A Assembleia Nacional do Poder Popular exige das autoridades norte-americanas que ponham um fim imediato ao tratamento injusto e ilegal contra Gerardo Hernández Nordelo e conta com o apoio da mais ampla solidariedade de parlamentares e pessoas honestas até conseguir a liberdade de nossos cinco companheiros e o regresso imediato para a nossa Pátria.

Fonte: Cuba Debate

extraído do site http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=160378&id_secao=7